Diariamente
somos confrontados com as mais diversas justificações sobre as origens e causas
da crise em que o país se encontra.
Foi
o desgoverno do Estado, foi a corrupção, foi a economia paralela, foi a má
preparação e falta de conhecimentos dos governantes, foi a ilusão do dinheiro
fácil, foi o crédito ilimitado, etc. E, relativamente aos argumentos e contra
argumentos sobre todas estas causas, enquanto geradoras de todos os nossos
males, divergem as elites deste país, sejam elas economistas, financeiros,
gestores, politicos ou outros. Cada um, como diz o povo puxa a brasa à sua
sardinha. Porém, de um modo subliminar, em muitas declarações, sobretudo de
alguns sectores políticos, sindicalistas, comentadores e fazedores de opinião,
na ausência de argumentos devidamente fundamentados, descobriram a razão de
todos os males – a banca e os funcionários públicos. Fácil, muito fácil mesmo,
enquanto intermediários da actividade financeira, fiéis depositários do
dinheiro, haverá melhores responsáveis do que a banca para justificar a falta
de poder de compra, da falta de dinheiro que nos apoquenta? E pelo lado da
despesa, para que servem os funcionários públicos, essa gente que nos complica
a vida e que nada faz? Estão encontrados os “bodes expiatórios”, a razão de todos
os males e o povo, ávido de
explicações, rapidamente adere.
Com
as devidas distâncias iedológicas e factuais, soa a um discurso já ouvido há
muito tempo. Num passado recente, para manipular as pessoas menos informadas e
em situação económica precária, e não encontrando justificação melhor, mais
concreta e fundamentada, os nazis apontaram baterias para os judeus.
Defenderam esta tese, enquanto valor social, como se fosse uma crença, fé ou
religião, o que, como todos sabemos, não é passível de combate lógico e, nesse
sentido, constitui um terreno muito propício para orientar e gerir, a seu belo
prazer, as emoções de uma sociedade descontente.
Não
quero com isto dizer que a situação é similar à referida, dada a sua dimensão
social e atitude nada ética, bem como a assunção de comportamentos a todos os
níveis reprováveis que esperamos nunca ver repetidos. Apenas o citei como
exemplo da manipulação e intoxicação da opinião pública utilizando argumentos
falaciosos.
Por
vezes, ao ouvir tanto radicalismo, tanto enfoque na banca e nos funcionários
públicos, interrogo-me se não estarão a tentar desviar as atenções do povo para
as verdadeiras causas desencadeadoras da crise, bem como dos factores que
efectivamente contribuiram para a referida situação. Mas, ainda mais
perturbador, é que me parece que muitos dos comentadores não o fazem intencionalmente,
mas por desconhecimento e/ou incompetência para analisar e concluir sobre os
factos.
É
que o tempo de se recorrer a um bode expiatório
não se compagina com a realidade global em que vivemos, onde tudo interage,
tudo influencia e é influenciado pelo meio envolvente. Não é tempo de se ter
uma atitude reducionista ao ponto de julgarmos que há apenas um único responsável
por tudo aquilo que nos rodeia.
Como
todos os agentes sociais, quer a banca quer os funcionários públicos têm o seu
papel e a sua quota parte de intervenção social, na medida em que influenciam e
são influenciados dentro da realidade onde se inserem. Neste sentido, esta manipulação,
apontando-os como origem de todos os males, não me parece correcta, nem sequer
a maneira mais adequada de se educar aqueles menos informados que necessitam de
ser esclarecidos, a não ser que queiramos caminhar para o fim da moeda e criar uma sociedade individualista, regressando ao tempo das
trocas directas e do nomadismo, crendo que assim tudo se resolverá e que
poderemos viver felizes para sempre.
Acredito
que as pessoas muito provavelmente gostariam de entender o que se passa à sua
volta, quais os fenómenos que provocam as alterações sociais, como reduzir os
seus efeitos, como participar nas decisões, como contribuir para solucionar os
problemas, mas para isso, as elites melhor informadas e detentoras do conhecimento,
deveriam interagir com os seus
concidadãos no sentido de os envolver na orientação dos seus destinos.
Infelizmente
parece que a nossa democracia ainda se encontra numa fase primária, onde o povo
ainda não teve a educação necessária, se sente confuso e aquela, apesar dos
seus 39 anos, ainda não terá saído verdadeiramente do papel.
Muitas pessoas sentem-se,
de um modo geral, catalogadas de esquerda ou de direita, como que remontando
aos tempos da Revolução Francesa, e face à ausência de melhores referenciais, ficam
sem saber em que lado se acomodarem. Penso mesmo que a maioria dos portugueses,
para além das frases feitas dos diversos partidos políticos, que se preocupam
mais em rotular os seus opositores, gastando o seu tempo em jogar à apanhada dos deslizes dos outros para os
usar nos seus combates políticos, não entende sequer o que é isso de esquerda
ou de direita. E, em vez de se deterem na abordagem das ideologias em presença,
já ouvi definir a direita como sendo a banca, os ricos, os patrões e todos
aqueles que vivem bem e a esquerda os operários, os trabalhadores e os pobres.
Será deste modo que conseguiremos ter um povo desenvolvido, pessoas informadas
e capazes de tomarem decisões, nomeadamente na eleição dos seus representantes?
Foto - J. A. Ferreira Alves
Sem comentários:
Enviar um comentário