Se há 900 anos Portugal andasse a falhar, já não existiria como país e nós provavelmente falaríamos espanhol.
Não devemos nem sobrevalorizar nem subestimar ou desprezar o povo e o país a que pertencemos (faces da mesma moeda). Ou seremos nós melhores do que os outros desse povo?
Expressamo-nos na língua que dele recebemos, desse tal povo que “há 900 anos anda a falhar”. É uma língua falhada? Longe disso, independentemente das polémicas em torno do acordo ortográfico! A língua, como todas as outras, continua a evoluir. E somos nós, os atuais portugueses, que a fazemos evoluir e a transmitiremos aos que virão.
Mas há mais. O que dizer sobre várias coisas que nós próprios e tantos estrangeiros – de nações que não têm vindo a falhar – apreciamos particularmente: gastronomia, vinhos, atitude, enfim toda a herança cultural que recebemos e desenvolvemos? Que devemos estimar, reavivar de um modo crítico e ampliar na medida das nossas possibilidades? Toda ela é fruto da vivência e dos esforços daqueles que nos precederam e de nós que ainda cá estamos. São esforços pontuais? Frequentemente sim, por vezes não.
Luís de Camões, Eça de Queirós ou Fernando Pessoa são figuras geniais e incontornáveis da humanidade. Mas nada seriam sem a herança cultural do país em que nasceram e viveram, essa herança que os moldou e os fez portugueses, mesmo na sua reação crítica a ela.
O que aconteceu, afinal, aos descendentes dos “heroicos portugueses da expansão marítima”? Desapareceram? Ou nunca existiram porque descendemos dos que cá ficaram? Que ideia, mesmo em termos simbólicos! Os que foram, na sua maioria, voltaram. Mas houve, na mesma época heroica, muitos “Velhos do Restelo” que criticaram os audaciosos. E ainda hoje os há – e, nisso, Portugal não é caso singular no planeta. Contudo, apesar dos resmungões, apesar da mentalidade conservadora e conformista, tantas vezes retrógrada, ainda hoje muitos portugueses trazem significativas contribuições para a humanidade: na ciência, na música, na literatura, enfim, na arte em geral.
Há 18 anos a EXPO’98 abriu-nos portas para o Mundo. Portugal deu decididamente um passo em frente, numa marcha que ainda hoje se prolonga; a realidade cultural enriqueceu-se, a começar pela música, as expetativas tornaram-se maiores e mais exigentes. A internet deixa-nos hoje menos isolados neste “cantinho da Europa”, o que deixa de constituir desculpa para o derrotismo. Trata-se apenas de não nos ficarmos pela fase mais simples: a do consumo.
O sentimento alheio de negação de tudo isso, baseado não na razão, mas em apreciações de ordem afetiva, traz-me à consciência a seguinte observação: a humanidade avança pelo esforço e muitas vezes o sacrifício de uns poucos, apesar de todos os que remam contra o tempo.
E este, creio eu, é o aspeto essencial: desde sempre, Portugal (o Mundo) vai progredindo, desbravando novas fronteiras apesar da resistência e relutância da maioria das gentes, uma resistência que, contudo e até certo ponto, é compreensível e necessária. Claro que se falha frequentemente! Só não falha quem não tenta, mas quem não tenta contraria a essência da vida, não precisa sequer de estar vivo. O importante, quando se falha e se acerta, é a lição que se tira, o que se aprende e o que se faz com isso. Estamos sempre de passagem para o futuro. E, como sempre, poucos têm a coragem de avançar apesar de...
Em resumo: para que não falhemos nós próprios, é necessária uma atitude combativa que promova a mudança do mundo (português, mas não só) e não uma espécie de imobilismo contrariado, decorrente de excessivo e pernicioso, supostamente crítico, niilismo.
Luís Dias Ferreira
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