Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

segunda-feira, setembro 29, 2008

Um Mundo dois sistemas


O Mundo vive desde meados do ano de 2007 uma crise financeira, para uns como não há memória, para outros como há poucas conhecidas. O fenómeno designado como “crise do crédito subprime” que se iniciou nos Estados Unidos da América no verão do ano transacto, depressa alastrou através de um “efeito dominó”, principalmente à Europa mas também à Ásia e Extremo Oriente. Este “efeito dominó” é nada mais do que o grau de interdependência e inter - relação existente entre os sistemas financeiros dos vários Continentes, dentro destes, entre os vários países e depois ainda entre todos os bancos que os compõem.

Com crises constantes e crescentes de liquidez e falta de confiança entre as instituições europeias, temos assistido com frequência desde o início desta crise, a acções de socorro prestadas pelo Banco Central Europeu (BCE) o qual, ao emprestar avultados montantes em fundos a curto prazo, tem ajudado a resolver as dificuldades financeiras existentes em muitos dos principais bancos europeus. Ainda há poucos dias assistimos a duas injecções de capital por parte do BCE no sistema bancário europeu, as quais somaram 100 mil milhões de euros em empréstimos a curto prazo. E o que sabemos é que pouco sabemos ainda da profundidade e longevidade desta crise.

Mas não tem sido apenas o BCE a prestar socorro às instituições financeiras europeias. São conhecidas as intervenções do tesouro americano na solvência e salvação de grandes instituições como a Fannie Mãe e Freddie Mac ou a seguradora AIG, intervenções estas já destinadas à recuperação total destas instituições. No Reino Unido, a nacionalização do Northern Rock e a aquisição do HBOS pelo Lloyds TSB, ou no caso da Dinamarca o socorro dado pelo Banco Central com mais 100 instituições ao Roskilde ou ao pequeno Ebh Bank, são exemplos da profundidade desta crise. Ao mesmo tempo que escrevo estas linhas tomamos conhecimento da intervenção conjunta dos governos da Bélgica, Holanda e Luxemburgo na salvação do Fortis Bank.

Nenhuma instituição financeira (bancária ou seguradora) poderá dizer que está incólume a esta crise financeira e à instabilidade do sistema financeiro mundial. Todos os bancos emprestam dinheiro a outros e recebem de outros empréstimos. Todos os bancos aplicam algures os seus fundos e excedentes de liquidez. Ainda que acredite na transparência do sistema, sabemos que, em muitos casos, o dinheiro recebido é depois reaplicado ou canalizado para produtos de maior complexidade. De qualquer forma é minha convicção que os governos, os bancos centrais e as instituições financeiras saudáveis, em articulação uns com os outros, não deixarão de intervir e de pôr a funcionar os mecanismos de salvaguarda que evitem um aprofundamento dramático desta crise. É preciso confiança no mercado, mas ao mesmo tempo é necessária uma dose de serenidade, bom senso e sangue frio para analisar os problemas e aplicar as curas respectivas. Nem que o sistema financeiro mundial tenha que se reposicionar em relação às linhas de orientação estratégicas do passado. A maturidade do sistema assim o obriga.

Mas ao mesmo tempo que assistimos à falta de liquidez de alguns dos bancos europeus e americanos, ao clima de algum pessimismo, depressão e “cinzentismo” vivido nos mercados ocidentais, podemos olhar para o sistema financeiro angolano com outras lentes e observar a dinâmica de crescimento, o brilho da confiança e a robustez da intervenção das instituições financeiras deste país. Por lá podemos observar que se respira confiança e ânimo. Os bancos com um bom nível de liquidez (a taxa de poupança em Angola muito perto dos 50% - valor estimado para 2008) que permitirá potencialmente financiar os investimentos há muito esperados. Os excedentes comerciais positivos que representarão este ano, pensa-se, cerca de 20% do PIB, com a consequente acumulação de reservas líquidas a atingir cerca de 20 mil milhões de USD em 2008, são razões de sobra para este optimismo. Os resultados das instituições bancárias angolanas e a dinâmica das mais recentes posições accionistas, dizem o resto sobre a alegria que se vive no sistema.

3 comentários:

Anónimo disse...

Caro Mário,

Obrigado pela tua importante síntese da situação financeira ao nível da parte do globo mais relevante para Portugal.

Também partilho da opinião que a perspectiva optimista é sempre a melhor.

Efectivamente, as razões da crise têm sido apontadas ao crédito subprime! Aspecto que parece replicares com acordo!
Mas na realidade o que se pretende afirmar com isso!?

- Que são os clientes os culpados!?

- Que o culpado é o mercado (talvez o imobiliário)!?

- O consumismo, as vistas grossas!?

- A igualdade de oportunidades!?

O que será que andam a tentar tapar… ou não ver?

Gostaria de ver a réplica a este comentário sem explicitar a uma opinião muito mais simples, mas muito mais grave.

Abraço,
Nuno Maia

Mário de Jesus disse...

Caríssimo confrade Nuno

A culpa não é dos consumidores que viram os bancos aceitarem financiar-lhes as suas casas e dizer que sim aos seus pedidos de crédito.

Também não é do mercado imobiliário porque este são todos os que compram e vendem, as instituições intervenientes e os activos que o compõem, logo é a soma e a interacção de todos estes intervenientes que uns sem os outros não fariam existir esse mercado.

Nem tampouco é da febre consumista porque o subprime é um sistema de empréstimos proveniente (atribuído) de familias de baixos rendimentos e alto risco que não vivem a febre da ostentação e do consumismo.

Mas é fundamentalmente resultado da ganância em querer fazer lucros rápidos e fáceis, avultados, de enriquecer a qualquer custo. Da falta de racionalidade dos bancos, operadores financeiros e dos dealers financeiros, dos conselhos de administração destas casas porque pretendem apresentar resultados empolados aos accionistas, fazerem subir as acções e assim ganharem milhões.

Estes sim, criaram produtos de tal forma complexos que não conseguiram controlar e depois...foi o que se viu. Ao ponto destes mestres geniais terem levado ao abatimento da actividade da banca de investimento nos EUA.

um abraço

Anónimo disse...

Caro Mário,

Fantástica réplica ... como sempre!

A simplicidade da palavra

"Ganância"

define efectivamente a realidade. E como sempre anda aliada de falta de escrúpulos e/ou de responsabilidade.

Quando vires uma galinha de ovos d`ouro desconfia ... (caso tenhas a sensatez de me informar recomendarei um bom oftalmologista)

Abraço,
Nuno Maia