Como
nota introdutória deste texto, gostaria de clarificar que não se trata de uma
crítica aos outros, mas de uma reflexão, enquanto cidadão e, de certo modo, uma
auto crítica que, se porventura servir para ajudar outros a reflectirem sobre
estas questões, deixar-me-á satisfeito e com o sentimento de ter dado o meu
contributo.
Tão pouco é uma critica à mudança social operada em 1974, que tive
o privilégio de presenciar e de colaborar enquanto militar e que nos trouxe
importantes alterações sociais. Todavia, passados cerca de 40 anos sobre o
evento, temos o direito e o dever de reflectir sobre a sua evolução que, como
tudo na vida, tem pontos positivos e negativos.
No
nosso dia a dia somos confrontados com opiniões sobre diversas situações e, sem
nos darmos conta, ajuizamos muitas vezes com base em preconceitos, juízos
previamente interiorizados, transmitidos e apreendidos através do nosso
envolvimento social ou em ideias feitas, ideias formadas através da frequência
de determinados eventos que a sociedade tende a generalizar e assumir como
verdade. Porém, estes juízos falham pela falta de racionalidade, pela falta de
argumentação sólida para justificar uma opinião, mais sustentados pelo diz que disse social e que tendem a
ficar e a serem assumidos como uma realidade provada sem provas.
No
primeiro caso temos assunções do tipo a
homossexualidade é uma doença ou o
lugar da mulher é em casa a cuidar dos filhos ou ainda os brancos são superiores às outras raças, admitindo sem necessidade
de provar o que quer que seja, porque é a verdade e toda a gente sabe que é
assim, porque sempre foi assim.
No
segundo caso podemos encontrar atitudes tipo as mulheres conduzem pior que os homens ou sempre houve ricos e pobres como uma forma de justificar o
injustificável, através de generalizações superficiais definindo certos
estereótipos, cuja justificação se assemelha às respostas dadas às crianças na
idade dos porquês, quando colocam questões mais ou menos incómodas aos pais e
estes se limitam a responder-lhes porque sim
e não se fala mais nisso.
Com
este tipo de raciocínio, facilmente generalizamos, por exemplo, que os pobres
são pouco cultos e têm fracas aptidões intelectuais ou que a mulher é o sexo
fraco.
Lembro-me
de quando tinha 15 anos, no antigo 6º ano liceal, actual 10º ano e se tinha a disciplina
de Filosofia, foi permitido aos alunos questionarem sobre a realidade e as suas
verdades e numa aula, obrigatória à época, de Religião e Moral, quando
questionado sobre Deus e as suas (im)perfeições, o padre responsável pela
disciplina, em resposta às dúvidas colocadas disse que compreender Deus é algo
transcendente e está fora das capacidades do homem. Pois, é assim quando não se
tem argumentos para justificar as nossas atitudes.
Tanspondo
para a nossa vida quotidiana e concretamente para a política, o que se
assemelha às atitudes acima descritas?
Haverá
um preconceito ou ideia feita, criados por determinados partidos políticos, na
qual só alguns têm competência para governar? Os outros são incompetentes,
não têm experiência nem capacidade, só criticam e nada sabem fazer, porquê?
Porque para aqueles partidos é conveniente, porque assim mantêm o seu estatuto
de privilégio e é por estas e por outras que desde 1974 temos tido alternância,
sem alternativa, sempre os mesmos a governar, ora uns ora outros, e os
resultados práticos estão à vista. Insatisfação popular, exemplos atrás de
exemplos de corrupção, de compadrio, de (des)governo em proveito próprio e a
pobreza a aumentar. Afinal que tipo de competências nos apresentaram aqueles
partidos? Que capacidades e conhecimentos nos demonstraram? Que mais valias
trouxeram para a nossa vida? Faz-me recordar um estória que a minha avó contava
sobre os avarentos e vigaristas, em que estes, quando se tratava de dividir com
os outros os rendimentos obtidos, no tempo em que o dinheiro era patacas o
faziam deste modo: pataca a mim, a mim
pataca, pataca a ti. E, pelos vistos, a história repete-se.
E
quando nos aproximamos das eleições lá vem o aviso, cuidado com os partidos fora
do arco da governação, vão-nos afundar, vamos perder tudo, vamos ficar mais
pobres, só sabem criticar, não têm competência nem experiência governativa. Mesmo
sem sequer terem como o comprovar, emitem-se juízos à priori, sem fundamento
lógico, apenas sustentados pelo receio de perderem o protagonismo, é a lógica
do papão, como se ainda fossemos
crianças, remetidas para o mundo dos fantasmas.
Claro
que convém reafirmar o medo, os argumentos não mudaram, são, de certo modo, os
mesmos do Estado Novo, a ameaça, agora não da prisão, mas do desemprego, da
miséria, como se não houvesse desemprego e miséria a olhos vistos. O Povo
português viveu sob o medo, acomodou-se e ficou algo apático até 1974. Acordou,
reclamou, exigiu nem sempre bem, mas não se calou, e agora, o que difere do
antigamente? Ah, pode-se falar, pode-se reclamar sem se ser preso, e depois?
Depois, fica-se na lista das dispensas, dos excedentários, independentemente
das suas competências, apenas porque se atreveu a falar, é uma outra forma de
exclusão. O Povo português regrediu aos anos do Estado Novo, está apático, não
reclama, tem medo, emigra, acentuando a tendência para sermos uma Nação cada
vez mais pequena. Mesmo assim, alguns governantes, têm o despudor de falar
sobre o problema da demografia como uma preocupação central a resolver, mas o
que acontece a uma mulher que engravida? Tem o emprego garantido? Tem a sua
vida profissional assegurada? Tem apoios na educação dos filhos? Ou há
sugestões dissimuladas para se admitirem homens de preferência? Porquê? Porque
não têm baixa de parto, porque não amamentam, porque em caso de doença são
geralmente as mães que faltam para prestar apoio aos filhos. Porém, não faltam
os defensores da maternidade, prometem leis, prometem sanções, tudo isto quando
estão noutra dimensão da realidade, mas o que acontece no dia a dia nas
empresas onde esses mesmos defensores têm cargos de decisão? Era interessante verificar.
E
se face ao descontentamento o povo reclama que são necessários novos políticos
com novas políticas, novos partidos alternativos, o que dizem os defensores do
actual sistema? Partidos alternativos, tipo Syrisa Grego? Deus nos livre, é o desastre, é a morte
da democracia. Mas qual democracia? A de poder falar mesmo sem se ter o que
comer? A de exigir menos austeridade e esta ser suportada pelos mais frágeis? Ou
a impossibilidade de participar activamente na vida política do país, dado o
sistema hermético em que vivemos, onde só os partidos definem quem participa e
quem pode ser deputado à Assembleia da República que, por sua vez, é a única
instância que pode legislar para alterar esta situação? Claro que não, e não bastasse
a resistência dos partidos do sistema, contam com a preciosa ajuda da UE, na
colocação de barreiras, em amedrontarem as pessoas, em criarem fantasmas e
criticarem as alternativas, porque simplesmente não têm argumentos nem
alternativas e só estão preocupados na manutenção dos seus lugares, dos seus
privilégios, pois mesmo em tempos de austeridade, esta, como se sabe, não é
igual para todos. Para quê pensar em alternativas, procurar encontrar
soluções, basta colocar entraves para que os “Syrisa’s” deste mundo falhem, é
mais fácil, não é preciso pensar nem provar nada, afinal sempre houve ricos e pobres, para quê pensar em algo que
erradique a pobreza? É contra natura e se calhar Deus assim o quer. Então não
há preocupação com os pobres? Não se criaram os Bancos Alimentares, as Ligas
Contra a Fome, a Santa Casa da Misericórdia, não se atribuíu o Rendimento
Social de Inserção? Enfim, é a política da caridadezinha, para a qual, sempre é
mais conveniente dar, de vez em quando um pouco de peixe, do que ensinar a
pescar.
E
porque será que a Educação é um tema sempre presente e inacabado, cujo controlo
é tão apetecível para certos extractos sociais? É que, sem formação, sem
educação, se consegue manipular muito melhor o povo, pois todos sabemos que um
povo culto é muito mais difícil de subjugar, porque sabe, porque conhece,
porque contesta, porque questiona e é capaz de pensar e compreender e o medo
com que lhes acenam não funciona.
Concluindo,
será de continuar a dar o voto e a aprovação aos que nunca fizeram nada em
favor do povo, aos que apenas se preocuparam em manter o “status quo”, aos de
sempre que querem simplesmente defender os seus empregos e os seus privilégios?
É que ser-se governante ou deputado, ao contrário do que se possa pensar, hoje já
não é uma missão, passou a ser um modo de vida, um emprego e, como diz o povo, viver não custa, o que custa é saber viver.
Assim,
será de continuar pela senda dos preconceitos e das ideias feitas, em vez de
exigir novos políticos? Ou será de continuar a votar nestes, nos do costume, com
o medo de mudar, refugiando-se no argumento de que com estes pelo menos sabemos
o que nos espera. E o que nos espera, a continuidade da alternância na
manutenção da ignorância do povo? Então votemos nos de sempre, para que as coisas
se mantenham como sempre, mas para isso é conveniente que a Educação não
avance, que continue apenas a ser, como sempre, uma paixão, senão ainda acaba
por colocar em causa a lógica do medo e do papão.
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