Fórum de Reflexão Económica e Social

«Se não interviermos e desistirmos, falhamos»

quarta-feira, fevereiro 19, 2014

A minha visão de reformar



Reformar, v.t. (do lat. reformare) - Dar forma nova, melhor ou mais aperfeiçoada. Atualizar, reorganizar. Restaurar, Corrigir, emendar. Abastecer. Dar a reforma a. (Lexicoteca - Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Círculo de Leitores).

Quando se fala em reformar o Estado, o que se quererá realmente dizer? Será que se pretende definir uma fase, um tempo para parar, cortar com o passado e começar algo de novo? Ou pretender-se-á atualizar, corrigir, aperfeiçoar algo? É que se se trata disto, e tudo me leva a crer que sim, já me é mais percetível. Mas, por outro lado, faz-me pensar, então não é isto que se faz, ou se deveria fazer sempre? É comum dizer-se que uma pessoa nunca está completamente feita, nunca sabe tudo, e que está, por isso mesmo, em constante aprendizagem, num processo permanente de formação, como diz o povo, aprende até morrer. Ou seja, o homem tem de ser capaz de integrar novos conhecimentos, novas realidades e adaptar-se a essas situações, logo, está em permanente mudança, evolução ou, se quisermos, em permanente reforma.

Não será isto que deve acontecer também com o Estado? Com as pessoas que gerem esse Estado? Com todos nós?

A ser assim não me parece fazer muito sentido dizer que é preciso uma reforma do Estado, uma vez que ele, como todos nós, está ou deveria estar, em constante mudança, ou seja em reforma. Muito provavelmente do que se trata é da constatação de que existem pessoas que têm dificuldade, ou não querem, atualizar-se e adaptar-se às novas realidades e isso levanta uma outra questão. É que nesse caso, o principal problema não será reformar o Estado, mas sim trocar certas pessoas por outras que sejam competentes e capazes de processarem as adaptações, correções ou atualizações necessárias de acordo com as novas realidades e com a evolução dos tempos para que não haja quem esteja ou queira travar a reforma.

Afinal como e quando reformar a Saúde, a Educação, a Justiça ou a Solidariedade Social? Cada caso é um caso e deve ser visto como tal. São realidades distintas, com processos de evolução distintos, e consequentemente necessidades de atualização distintas no tempo e no modo, sendo que o que importa é estarem em permanente estado de mudança, em permanente evolução de acordo com a sua própria realidade.

As coisas não se alteram todas ao mesmo tempo, nem com o mesmo ritmo, só porque se diz ou se quer, têm a sua própria idiossincrasia e querer meter tudo no mesmo saco, como o demonstra a experiência, é meio caminho andado para o insucesso.

A meu ver, a reforma é um modo de estar, em constante evolução e permanente adaptação às novas realidades e, por isso mesmo, nunca está concluída. Neste sentido, quando ouço dizer que é preciso fazer uma Reforma do Estado, fico sempre  sem saber se o que se pretende é mudar as pessoas que não são competentes para conduzir este processo ou se se trata de outra coisa.

Parece-me fazer mais sentido dizer que é preciso ir actualizando e adaptando os modelos da prestação da Saúde, da Justiça, da Educação ou da Solidariedade Social, cada um de per si, sempre que as realidades situacionais o exijam e, deste modo, respondam às solicitações da sociedade.

Nos casos em que determinado modelo, como um todo, se torne obsoleto e já não responda, talvez seja necessário uma mudança radical, então que se faça o corte com o modelo velho e se construa um modelo totalmente novo mas que não seja uma reformulação do anterior, pois nesse caso não se trata de uma verdadeira mudança, mas de uma mudança na continuidade.

Creio mesmo que uma das principais necessidades de mudança se encontra ao nível das pessoas, daqueles que gerem os ministérios. Se se diz frequentemente que a gestão privada, nas mesmas condições e com os mesmos problemas, é melhor e mais eficaz do que a gestão pública, então provavelmente não se tata de um problema de modelo mas de pessoas.

Ou então, talvez que as pessoas agregadas a determinados ministérios devessem ter um período de permanência maior ou efetiva, diria mesmo profissional, para poderem dar garantias de continuidade aos processos em curso e participarem nas mudanças que se afigurem pertinentes, quaisquer que sejam os governantes. Porém, estas pessoas deveriam ser selecionadas de acordo com as suas competências profissionais e não por nomeação partidária, pois por muito competentes que o sejam, mesmo com experiênca profissional no privado, como se sabe, poderão ter de sair nas eleições seguintes e os que se lhe seguirem, tudo farão para alterar e dar o seu cunho pessoal, quer por questões de egoísmo quer por razões de autoestima pessoal. Mudando apenas os ministros, mesmo que estes pretendam dar o seu cunho pessoal, nem todo o conhecimento dos processos em curso e respetiva informação se perderiam se a maioria do quadro de pessoal dos gabinetes fosse profissional, o que se traduziria em maior celeridade e recetividade à mudança, mas que, de todo, não é o caso português. 

Deste modo vejo muito difícil operar-se qualquer mudança sustentável, uma vez que um mandato não dá para a concretizar e, de um modo geral, as pessoas que as deveriam realizar não são as mais competentes nem as mais indicadas para tal. Na realidade, o que vamos tendo é uma amálgama pouco consistente de situações, qual tecido remendado e fragilizado.

Em suma, a meu ver, para que qualquer futura reforma seja viável, deve-se começar por dar a reforma a estas pessoas que andam há décadas nos corredores do poder e que não atam nem desatam. Como muitos já o disseram, provavelmente isto só se resolve com novos partidos e com novas pessoas, sob pena de daqui a 10, 15 ou 20 anos ainda andarmos a falar do mesmo.

Foto - José A. Ferreira Alves

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